agosto 22, 2006

Sauna

Quando gosto de algo, gosto, gosto, gosto mesmo. No dia 25/07/06, na abertura do Programa Sr Brasil, Rolandro Boldrin narrou o "causo" da cadelinha Sauna. Fiquei encantada com a beleza do texto. Passei a olhar diariamente no portal do programa para ver a publicação, mas nada. Liguei então para a produção, esperei alguns dias e acabei recebendo. (Que atenção e educação).


Sauna

Agora vou falar de Sauna
Duma pequena cadela
Que era a imagem da desgraça
Naquela rica fazenda
Entre os cachorros de raça
Do fazendeiro
A pobre era desprezada
Por todos lá da vivenda

Mártir, velha, escorraçada
Quase no extremo da vida
Andava sempre escondida
E não morria esfomeada
Por que às vezes lhe tocava
Um restinho de comida
Que a outro cão sobejava

Diga eu embora uma heresia
Mas eu confesso que um dia
Vendo os olhos de sauna
Lembrei-me dos santos olhos
Da santa virgem Maria.
Era saudosa e macia
Como a sombra do luar.
Quanta dor, quanta poesia
E quanta filosofia chorava daquele olhar

Entre os bichos prediletos
Que o fazendeiro mais estimava
Tinha o primeiro lugar
Um papagaio faceiro
Que levava o dia inteiro
E a noite inteira falar (imita)
Tudo que se lhe dizia
Coçando a sua cabecinha
De pronto reproduzia
E ele o louro esse papagaio
Era o amigo singular
De sauna a cachorrinha

Sauna que inocente se entretinha
Divertia-se ouvindo o louro tagarelar
Quando às vezes lhe faltava
Um osso para o jantar
Era belo era sublime
Ver aquele papagaio
Como quem comete um crime
Às escondidas lhe ofertar
Alguns bocados gostosos
Do seu gostoso manjar

O louro sabia o nome
De toda raça canina
E chamava pela tarde
Os cachorros um por um
Chamava todos por ordem
Sem esquecer de nenhum
Mas o nome de sauna
Era o que mais ele repetia
Falava pela manhã de tardinha
A todo instante do dia
Aquele nome tão doce
Vinte vezes proferia
Sauna? Sauna?

Mas, diz um velho ditado
Não a mal que sempre dure
Nem bem que não tenha fim
Pois foi assim, foi assim
Que um dia a mártir leprosa
Desdentada cancerosa
Os olhos tristes fecharam
E mais feliz descansou.
Sim foi Deus quem a levou.

Sauna foi encontrada
Com a barriga toda inchada
Junto à porta do curral.
E morta e rígida e fria
Nos seus olhos inda eu lia
Aquela filosofia
Da dor irracional

Pois bem: nesse mesmo dia
Em que sauna a cadelinha espirou
Quem sabe talvez de fome
O bondoso papagaio
Chamando pelo seu nome
Com aquela doce meiguice
E me olhando de soslaio
A cabecinha inclinou
Sauna? Sauna?
Sauna morreu; eu lhe disse
Morreu? Ele perguntou

E depois de eu repetir-lhe
Essa palavra importuna...
As suas penas ruflando
Pôs-se alegre assobiando
Uns cantos sentimentais
Mais desde aquele momento
Pelo nome de Sauna a cadelinha coitada
Não chamou.
Não chamou nunca mais.

"Oh! Deus que porque não fizestes os homens irracionais."

5 comentários:

Arturo O.Bandini disse...

Muito bonito, me emocionou.

Capi disse...

Adoro o Sr. Brasil!

Codinome Beija-Flor disse...

Arturo,
Sinto-me honrada com sua visita.
E sobre "Sauna", também fiquei emocionada.
Abraços

Codinome Beija-Flor disse...

Capi,
Eu sou fã mesmo. Já descobri os dias de gravação. Agora só falta um tempinho, para eu ver de pertinho.
Abraços

cannisluppus disse...

Ainda bem que vc postou essa preciosidade. Assistí a uma reprise hoje (11/02/2007) e procurei por esta estória e só encontrei no seu blog. Obrigado!

O Que Sou:

Um misto de:
Fracasso e conquista,
Coragem e medo,
Brutalidade e fragilidade,
Vida e morte, mulher e bicho,
Sonhos e pesadelos.
Sou um fio de esperança.

"Um misto de fracasso e de conquista.
Um medo transmutado de coragem.
Tão frágil como a rosa que se avista.
Brutal no cinzentismo da paisagem.
Assim mulher e bicho me retrato.
Mesclando o pesadelo com o sonho.
E vivo de incertezas... e me mato.
Num fio de esperança que reponho."
(Jorge)

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